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quarta-feira, 19 de maio de 2010

Projetos Contra Mulheres: AMANHÃ na Câmara

Constam na pauta da CSSF (Comissão de Seguridade Social e Família) desta quarta-feira (19 de maio, às 9h e 30m) seis projetos de lei relativos à interrupção da gravidez que, se aprovados, conforme propõem seus relatores, darão um passo a mais para a criminalização e discriminação das mulheres no Brasil. É de extrema importância a participação das mulheres em peso nessas discussões.

O PL nº 478/2007 (item 10) que institui o Estatuto do Nascituro, apresenta problemas jurídicos elementares. Institucionaliza a violência ao criar o dever de pensão a criminosos de violência sexual (artigo 13); impõe uma moralidade específica e ignora o Estado Laico e democrático (artigos 2º, 3º e 8º). Ademais, o status inferior dado às mulheres no âmbito do Estatuto implica na ausência do reconhecimento de sua condição contemporânea como sujeitos morais e de direitos. A proposta de se proteger os seres humanos não nascidos é legítima, mas, se torna ilegítima e incompatível com os princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito no momento em que viola e/ou ignora a igualdade, a liberdade, e a dignidade das mulheres como seres humanos. Por fim, e igualmente importante, o PL institucionaliza a tortura e impõe um terrorismo de Estado, ao chancelar as seqüelas e a permanência do ato criminoso da violência sexual, características essas de estados totalitários.

O PL nº 2.185/2007 (item 46) altera o art. 7° da Lei n° 9.263, de 12 de janeiro de 1996 (Lei de planejamento familiar), de modo a proibir a participação direta ou indireta de empresas ou capitais estrangeiros nas ações e pesquisas de planejamento familiar. Na verdade, o projeto visa impedir qualquer recurso para organizações brasileiras que lutem pelos direitos das mulheres no sentido do avanço da legislação em direitos sexuais e reprodutivos bem como na implementação de políticas públicas em saúde sexual e reprodutiva.

O PL nº 2.504/07 (item 49) cria o cadastro obrigatório de gravidez em todas as unidades de saúde, com o deliberado intuito de controlar a autonomia reprodutiva das mulheres, buscando como objetivo final a criminalização de mulheres que tenham praticado o aborto. O inciso IV do PL se refere a “dados probatórios para a comprovação do aborto” e explicita tal intenção de obtenção de provas para a prática do aborto através do cadastramento obrigatório e viola diversos princípios constitucionais, tais como: o princípio da intimidade e da privacidade (artigo 5º, inciso X); o princípio da presunção da inocência (artigo 5º, inciso LVII); o princípio da boa fé que deve reger as normas legais, já que parte do pressuposto que as mulheres gestantes são criminosas em potencial. Além disso, viola o direito de não produzir prova contra si, bem como o direito ao segredo médico e à confidencialidade, pois obriga o médico a cadastrar a paciente para fins de prova de aborto. Ou seja, impõe publicidade a uma relação que é privada e particular, porque estabelecida em confiança, a um profissional da área de saúde. Além disso, viola a Resolução nº 1.605/2000 do Conselho Federal de Medicina que desobriga os médicos a fornecerem prontuários médicos e informações que possam criminalizar pacientes.

O PL 3.204/08 (item 58), que propõe a obrigatoriedade de se estampar, nas embalagens de produtos para detecção de gravidez, a advertência “aborto é crime: aborto traz risco de morte à mãe; a pena por aborto provocado é de 1 a 3 anos de detenção”. O projeto fere o direito humano de ter acesso ao conhecimento científico e à informação sobre a reprodução humana, coagindo as mulheres do exercício do direito de escolha, bem como reforçando uma perspectiva punitiva contrária aos acordos internacionais assinados pelo Estado Brasileiro.

O PL 4.239/08 (item 80), que cria Programa de Casas de Apoio destinadas ao atendimento de adolescentes grávidas, merece ser rejeitado, conforme proposto pelo relator, Deputado Eduardo Barbosa. Isso porque a criação de programas públicos não cabe ao Congresso Nacional, mas ao poder Executivo.

Por fim, causa ainda preocupação o PL 4.594/09 (item 86), que dispõe sobre o sepultamento e o assentamento do óbito em caso de perdas fetais. O projeto também merece rejeição conforme parecer da relatora, Deputada Jô Moraes, pois é inócuo, já que a dignidade do tratamento das perdas fetais está sendo observada na legislação e regulamentos sanitários do Brasil, pois em todas as situações os destinos previstos são o sepultamento, a incineração ou a cremação.

Dessa forma, convocamos todas as mulheres para manifestar-se contra esses projetos amanhã, quarta-feira (19) na Comissão de Seguridade Social e Família. Às 9h30m, no Anexo II, Plenário 7, Câmara dos Deputados.

Nós e o Movimento Estudantil

Paula Regina de Oliveira Cordeiro, estudante de Geografia- UFBA, militante dos coletivos Contra Corrente (levante feminista e de gênero) e Mulheres na Rua.
 
Nós, mulheres, sempre encontramos maneiras de nos reunir para organizarmo-nos, isso se deu das mais diversas maneiras, de acordo com as exigências de tempo, espaço e privação. Fomos as negras que lutaram e expulsaram, as sufragistas que conquistaram os votos, as lésbicas que levantaram as vozes, as poetizas que reinventaram as letras, as artistas que deram as nossas formas, as escritoras que apontaram o nosso ver e existir e agora temos que ser as estudantes que falam, que reivindicam uma nova maneira de fazer e ser política.
Poderia ir pelo viés: “quantas mulheres estão fazendo parte dos cargos mais importantes do Movimento Estudantil?”, mas como diz uma grande amiga “Ser mulher não basta. Mulher por mulher o mundo está cheio. Mulher não é sujeito político. Temos que ser Feministas. Feminista no seu sentido mais radical e defender as mulheres sempre.”. Prefiro, pois, ir aos problemas mais acalorados e difíceis.
O primeiro deles é o direito a fala e a maneira com a qual são conduzidos os debates e os espaços. Os companheiros não têm a sensibilidade, ou simplesmente não querem mesmo, perceber que fomos treinadas – graças à justificativa biológica – para não nos posicionarmos, falarmos ou até mesmo pensarmos. E, caem numa reprodução de construção de debates que continua a não permitir o nosso posicionamento, a não ser que nos portemos como eles “homens”. Não quero aqui discutir essas categorias de gênero mais profundamente, pois fugiria do objetivo central do texto. Com esse fazer político “masculino”, somos forçadas a nos comportar como eles ou a nos omitir por completo, cuidando apenas das atas, das artes e de outras atividades socialmente destinadas a mulher.
O segundo, e talvez o mais grave, seja a tática dois (sem falar na 3, 4, 5 que estão começando a entrar na moda), mais conhecida como t2. A tática dois se consiste basicamente em pessoas seduzirem outras pessoas para entrarem no Movimento Estudantil – e nas suas correntes políticas dentro do mesmo. Sedução essa que por vezes compromete a pessoa que está sendo cooptada. Para muitas/os tal tática é transversal, ou seja, atinge tanto homens quanto mulheres, mas para mim ela é sexista, misógina e machista. As mulheres, novamente pela construção que lhes são impostas, estão muito mais expostas a cair nessa armadilha. Um carinha descolado começa a se interessar por ela, de repente ela se vê envolvida com várias pessoas, festas, sensações novas, entra no M.E e o carinha a larga. Além de ser completamente repudiável, a t2 reforça o papel submisso da mulher, somos vistas como carne, massas de manobra. Depois de entrar na corrente, as mulheres acabam sendo vítimas do problema número um. Sendo invisíveis, a não ser quando as mesmas se revoltam, se organizam, mostram a cara e começam a questionar, o que não é muito bem visto pelos companheiros, já que “a conjuntura não é favorável, companheira.”, ou melhor, “temos que nos manter unidas/os sempre.”. 
O terceiro problema que identifico é o não respeito pelas bandeiras feministas dentro do Movimento Estudantil. O aborto não está sendo discutido, a sua legalização não está sendo pautada; o fim da violência sexista anda no mesmo processo, assim como o assédio sexual, moral e emocional. Sem falar que, como me refiro ao M.E da/na Universidade, a interseccionalidade de Gênero, Raça e Classe quase nunca é tocada, já que os companheiros estão interessados unicamente (e de maneira às vezes rasteira) no debate de Classe, tornando-a mais importante que os demais. Ficamos refém, portanto da vontade política e ideológica dos homens para tocar as nossas bandeiras históricas.  E até quando continuaremos reféns?
O quarto problema é o aparelhamento e emperramento por parte dos companheiros dos instrumentos de lutas historicamente feministas. Vide, a utilização destes instrumentos para eleição de chapas de DCE’s, CA’s e DA’s; sua pouca ou nula atividade dentro e fora da Universidade, e quando as atividades ocorrem restringem-se apenas à luta burocrática, a qual fere o caráter criativo do feminismo que sempre foi caracterizado pelo enfrentamento político direto (nas suas diferentes táticas e estratégias), intelectual e político (esferas de poder burocráticas ou não).
Quero lembrar, que o meu problema não é com todos os companheiros do M.E, mas sim com aqueles que fazem questão de manter o papel socialmente construído da mulher dentro dos espaços de poder e disputa. A crítica é para os companheiros que nunca pararam pra pensar até que grau estão oprimindo as mulheres dentro e fora do M.E. E critico, nós mulheres que não conseguimos romper com essas amarras e nos mostrar firmes, políticas, agressivas e combatentes. A nós, que não nos organizamos que não impomos as pautas feministas dentro de nosso raio de militância. E acho que está na hora de retomar as experiências das feministas revolucionárias e criarmos e tomarmos o nosso espaço, na tentativa também de re-movimentar o movimento estudantil. De construir com as e os estudantes as nossas pautas, para que possamos ter vitórias políticas concretas.
Aproveito a emoção e a força herdada de Audre Lorde para agradecer as minhas companheiras e companheiros (de verdade), que me deram o caldo político para escrever essa carta/texto. Agradecer as companheiras que se identificam como Feministas e que tem tentado travar esse debate dentro dos seus espaços de militância. E aos companheiros que tem nos apoiado e provado que ser pró-feminista também é muito importante. Agradeço às minhas rainhas ancestrais, as guerreiras ainda presentes e as que virão.
E proponho: organizem-se, combatam, vivam e vençam. Precisamos enfiar com muito debate e proposições as nossas bandeiras, as nossas angústias. Por que o pessoal é político e o Movimento Estudantil precisa saber disso.

domingo, 16 de maio de 2010

As leis de aborto no Brasil e no mundo

O curioso é que o Brasil vem fazendo a lição de casa e avançando em inúmeros setores, mas continua refém do moralismo no trato de uma questão feminina que não está na mão da mulher, mas sob tutela do Estado, como ocorre no autoritário Afeganistão, onde uma afegã tem a mesma autonomia que um animal doméstico.

Na outra ponta, a maioria dos países com leis flexíveis mantém os problemas econômicos sob controle e a população tem maior bem-estar, caso de Alemanha, França, Portugal e Canadá. Segundo Carmen Hein de Campos, advogada brasileira ligada à ONG e que colaborou na execução do mapa, a posição da mulher nesses países também é melhor, a diferença salarial entre os sexos é menor e o nível educacional elevado, o que garante equilíbrio nas relações de gênero. Outra observação de Carmen: a influência religiosa sobre a saúde reprodutiva é reduzida nos países mais desenvolvidos.

O mapa ajuda a ampliar a reflexão, que aqui setor na mais urgente, porque, se depender do Congresso Nacional, a situação vai se complicar.

No dia 7 de maio passado, o Projeto de Lei nº 1.135/91, que descriminaliza o aborto, sofreu uma amarga derrota na Comissão de Seguridade Social e Família (CSSF). Ali, depois de cinco horas de confusão e insultos trocados entre parlamentares – onde o de bate não teve vez –, 33 deles aprovaram o parecer do relator Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP), que, em outras palavras, mantém a interrupção da gravidez como crime, com pena de um a três anos de reclusão. Sete deputados que defendiam o projeto saíram sem votar, em sinal de protesto. A matéria foi para a Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania, onde terá de ser travada uma batalha ainda mais dura antes de ir para a decisão final, no plenário.

O panorama pode ficar mais sombrio se forem aprovados outros 15 projetos sobre o tema, apresentados só no ano passado na Câmara e no Senado. Deles, 13 tornam a legislação ainda mais retrógrada.

Um deles, do deputado Henrique Afonso (PT-AC), cassa o direito de abortar quando a gravidez é fruto de estupro ou põe em risco a vida da gestante. Assim, o aborto legal não seria feito pelo Sistema Único de Saúde, como é hoje. Outro projeto torna a interrupção crime hediondo, sem benefícios para o preso.

Mesmo que você seja contra o aborto e que tenha certeza de que jamais irá praticá-lo deve entrar nessa discussão, já que a proibição não impede que a cada ano, conforme estimativas, 1 milhão de abortos sejam realizados no Brasil, sendo que 220 mil deles levam a infecções graves e perfurações no útero, entre outras complicações.

Concordar com a descriminalização não é endossar a prática como método de planejamento familiar.

Trata-se de respeitar o direito de quem pensa diferente, numa sociedade diversa e plural como a nossa. Veja os principais projetos protocolados em 2007 na câmara e no Senado e saiba por que a discussão não avança no Congresso.

Fonte:
http://claudia.abril.com.br/materias/2882/?pagina2&sh=31&cnl=35&sc=

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Próxima Reunião de Mulheres da ExNEL

A próxima Reunião Temática de Mulheres da ExNEL será on-line no domingo, 16 de maio de 2010, às 14h pelo grupo de Msn de Mulheres da ExNEL: group780787@groupsim.com

Pauta:
- Descriminalização das Mulheres e Legalização do Aborto
- Mercantilização do Corpo Feminino
- Sexismo Linguístico: Linguagem Inclusiva e Exclusiva

Essa reunião é voltada exclusivamente às mulheres, não precisando necessariamente que as mesmas façam parte da Executiva. Todas as mulheres, estudantes de Letras ou não, podem colaborar com o coletivo e participar dele.

Contamos com a presença de vocês!

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Repúdio ao Machismo e Racismo

Repúdio ao racismo e machismo

Indignadas com o discurso do senador Demóstenes Torres (DEM-Goiás), que afirmou que os estupros praticados durante o escravismo eram consensuais e responsabilizou os negros pela própria escravidão, mulheres do movimento negro elaboraram uma Carta de Repúdio, que foi entregue na sexta-feira (05/03) na Corregedoria do Senado e no gabinete do próprio senador.

Leia íntegra da nota de repúdio

Nós, Conselheiras e Conselheiros do Conselho Nacional de Políticas de Promoção da Igualdade Racial - CNPIR vimos através desta, repudiar a opinião expressada pelo excelentíssimo senador da república sr. Demóstenes Torres, Presidente da Comissão de Constituição Justiça e Cidadania do Senado Federal, no seu pronunciamento durante a Audiência Pública no Supremo Tribunal Federal do Brasil (STF), no dia 03 de Março de 2010, que analisava o recurso instituído pelo Partido Democratas contra as Cotas para Negros na Universidade de Brasília.

Na oportunidade o mesmo afirmou que: as mulheres negras não foram vítimas dos abusos sexuais, dos estupros cometidos pelos Senhores de Escravos e, que houve sim consentimento por parte destas mulheres. Na sua opinião: Tudo era consensual!. O excelentíssimo senador da república Demóstenes Torres, continua sua fala descartando a possibilidade da violência física e sexual vivida por negras africanas neste período supracitado. Relembra-nos a frase: Estupra, mas não mata!!!.

O excelentíssimo senador Demóstenes aprofunda mais ainda seu discurso machista e racista, quando afirma que as mulheres negras usam de um discurso vitimizado ao afirmarem que são as vítimas diretas dos maus tratos e discriminações no que se refere ao atendimento destas na saúde pública. Que as pesquisas apresentadas para justificar a necessidade de políticas públicas específicas, são duvidosas e que nem sempre são confiáveis, pois podem ser burladas e conter números falsos.

Enquanto o estado brasileiro reconhece a situação de violência física e sexual sofrida pelas mulheres brasileiras, criando mecanismos de proteção como a Lei Maria da Penha, quando neste ano comemoramos 100 anos do Dia Internacional da Mulher, o excelentíssimo senador, vem na contramão da história e dos fatos expressando o mais refinado preconceito, machismo e racismo incrustado na sociedade brasileira.

Por isso, vimos através desta carta ao Povo Brasileiro repudiar a atitude do excelentíssimo senador Demóstenes Torres.

Ao tempo em que resgatamos a dignidade das mulheres negras e indígenas, que durante a formação desta grande nação, foram SIM abusadas, foram SIM estupradas, foram SIM torturadas, foram SIM violentadas em seu físico e sua dignidade. Aos filhos dos seus algozes, o leite do seu peito, aos seus filhos, o chicote. Não nos curvaremos ao discurso machista e racista do Senador! É inaceitável, que o pensamento dos Senhores de Engenho se expresse em atitudes no Parlamento Brasileiro.

Fonte: http://carosamigos.terra.com.br/index_site.php?pag=materia&id=181

Das ações sobre aborto no Brasil, 31% julgam violência contra gestantes

Estudo analisou quase 800 decisões de tribunais estaduais, STJ e STF.
67% dos casos ocorrem no Sudeste; 63% são de homicídio.

Fonte: AMB

Pesquisa inédita constatou que 31% das ações judicias que tratam de aborto no Brasil referem-se a interrupções de gravidez causadas por violência contra gestantes. As autoras, a advogada Tamara Amoroso Gonçalves e a socióloga Thais de Souza Lapa, analisaram durante cerca de um ano 781 processos julgados pelos Tribunais de Justiça de todos os estados, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF) entre 2001 e 2006.

Apoiadas pelo Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), as pesquisadoras iniciaram a leitura dos acórdãos interessadas em avaliar a influência de conceitos religiosos nas decisões do Poder Judiciário. Em 2004, a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde (CNTS) entrou com ação no STF pedindo que a interrupção de gravidez de fetos anencéfalos "ou portadores de qualquer outra malformação que torne inviável a vida extrauterina" fosse dispensada de autorização judicial. Desde então, a questão mobiliza grupos religiosos que pregam a sacralidade da vida desde a concepção e entidades que defendem o direito de escolha da mulher. (Cinco anos depois, o Supremo ainda não tomou uma decisão na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 54.)

Atiramos no que vimos e acertamos o que não vimos

No entanto, além do debate jurídico e filosófico em torno do aborto de feto anencéfalo, as pesquisadores acabaram se deparando com muito mais. "Atiramos no que vimos e acertamos no que não vimos", disse Tamara ao G1. "Ao iniciar-se este trabalho não se pensou que haveria correlação tão significativa entre os temas 'aborto' e 'violência'", escrevem. No processo de coleta dos dados, elas verificaram que, na maior parte dos casos, as agressões eram praticadas pelo próprio companheiro ou por ex-companheiro. As razões variavam: da indignação de um ex-namorado, por exemplo, por não conseguir reatar, até o cálculo de quem mata a ex-mulher grávida porque já está em outro relacionamento "não quer haver-se com a ex-companheira gestante de um filho seu".
Do total de processos vinculando aborto à violência, 67% eram da Região Sudeste, 20% da Sul, 7% da Centro-Oeste, 4% da Nordeste e 2% da Norte. Essa predominância reflete, é claro, o relativo maior acesso ao Judiciário nos estados mais desenvolvidos do país. Quanto à tipificação penal, 63% tratavam de "homicídio e aborto não consentido". Em segundo lugar destacavam-se casos de "violência sexual de criança ou adolescente até 14 anos e aborto", com 10%.

Tamara e Thais verificaram ainda que a interferência de argumentação de teor religioso em processos que tratavam de violência e aborto foi ínfima: só 1 acórdão (0,42% do total), do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, citava um versículo da Bíblia e reproduzia um provérbio sobre como %u201Cas tantas vezes em que Deus não quer dar aos juízes o esclarecimento de um crime é prova manifesta de que o reserva para o augusto tribunal de sua Divina Justiça%u201D.

%u201CIsso demonstra que talvez temas com maior destaque social, como a anencefalia, insuflem mais posicionamentos religiosos por parte dos magistrados%u201D, escrevem as pesquisadoras.

Os dados encontrados nesta pesquisa indicam que é necessário aprofundar estudos sobre violência contra mulheres grávidas, uma vez que no decorrer da investigação surgiram temas inesperados, ainda muito pouco explorados, disse Tamara ao G1. O fato de tantos casos sobre aborto envolverem também uma violência contra a mulher conjuga dois temas que sempre foram tratados separadamente nos movimentos feministas, por exemplo. Penso que a pesquisa aponta para novas necessidades e possibilidades de atuação.


Fonte: Ricardo Muniz Do G1, em São Paulo.

Multimulher?

A marca da Multimulher:
Como a propaganda influencia, disfarçada de modernidade, as relações de desigualdade?
Pense nisso.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Mais uma morte evitável de gestante no Brasil

Fonte: CFEMEA - Centro Feminista de Estudos e Assessoria
http://www.cfemea.org.br/

NOTA PÚBLICA

As Jornadas Brasileiras pelo Aborto Legal vem a público, através desta nota, exigir a responsabilização das instâncias governamentais e jurídicas que permitiram que mais uma mulher perdesse a vida, assim como chamar a atenção da sociedade e dos governos para uma situação que se repete cotidianamente.

Esta semana, uma mulher potiguar morreu na hora do parto, realizado na Maternidade Januário Cicco, vinculada à Universidade Federal do Rio Grande do Norte. A paciente, que teve uma gestação de feto com uma doença que é incompatível com a vida extra-uterina, solicitou, via Ministério Público do Rio Grande do Norte, para fazer um abortamento assistido. Seu direito foi lhe negado e como conseqüência desse fato mais uma mulher perdeu a vida.

A criminalização do aborto, repetidamente, demonstra seu impacto na saúde pública, na saúde das brasileiras e no cumprimento da lei, visto que em casos como este, a interrupção era um direito da mulher. Mais uma morte evitável de gestante no Brasil ressalta a inviabilidade dos discursos, práticas e leis fundamentalistas que criminalizam as mulheres que praticam o aborto.

De mesmo modo, as discussões em torno do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3), com tentativas de setores conservadores para modificar pontos aprovados pela Conferência Nacional de Direitos Humanos também revela a urgência do governo e dos (as) nossos (as) governantes cumprirem seu papel de gestores de um Estado Laico e de legislarem em favor da sua população e não de interesses particulares.

Paralelamente, a Comissão de Seguridade Social e Família da Câmara dos Deputados tem sido palco da atuação de parlamentares que têm dedicado seus mandatos a uma crescente perseguição e criminalização das mulheres, propondo verdadeiros retrocessos legislativos. Nessa Comissão tramitam proposições legislativas que limitam os direitos sexuais e reprodutivos e colocam em risco a vida e a saúde de milhares de mulheres por todo o país. Se aprovados, conforme propõem seus relatores, as proposições darão um passo a mais para a criminalização e discriminação das mulheres no Brasil.

O Brasil é signatário de acordos internacionais que garantem os direitos reprodutivos e sexuais das mulheres como a Conferência Internacional de População e Desenvolvimento (Cairo, 1994), a IV Conferência Mundial sobre a Mulher (Beijing, 1995), a Cúpula sobre Desenvolvimento Social (1995), a Sessão Especial da Assembléia Geral das Nações Unidas sobre a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (1999), a Resolução da Declaração do Milênio das Nações Unidas, adotada pela Assembléia Geral (2000) e a Sessão Especial da Assembléia Geral das Nações Unidas sobre a IV Conferência Mundial sobre a Mulher.

A existência no Estado Brasileiro de Marcos Legais Nacionais e Internacionais de proteção dos direitos humanos das mulheres no âmbito da saúde e dos direitos sexuais e reprodutivos, não tem, no entanto, se revertido em mudanças significativas nos indicadores de qualidade de vida das mulheres de baixa renda, das negras, das indígenas, das mulheres rurais e no sistema prisional, bem como daquelas excluídas dos bens sociais. A criminalização do aborto é um fator importante de vitimização das mulheres brasileiras, lançando-as a práticas inseguras e clandestinas em relação às gestações não desejadas e não planejadas. Cerca de 1 milhão de abortos são realizados anualmente no Brasil, dos quais 250 mil apresentam complicações, necessitando de internação no Sistema Único de Saúde.

Enquanto os poderes públicos virarem as costas para a realidade do aborto inseguro e das práticas não humanizadas na atenção à saúde reprodutiva das mulheres, mais mortes evitáveis acontecerão.

Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro